O carnaval de rua, em Uberlândia, ajudou no combate ao preconceito que já foi muito forte na cidade.
O Brasil é conhecido mundialmente como o país do Carnaval e nesta época é destaque na imprensa internacional. Para muitos é sinônimo de alegria, descontração e folia. A “mulata” marca presença e com o samba no pé, marcado pela bateria nota 10, é símbolo do carnaval brasileiro.
Mas o que é carnaval, qual sua origem, como chegou a Uberlândia? Para responder estas e outras curiosidades, aproveitando a semana da “folia”, convidamos para o “Bate Papo Digital” o historiador e jornalista Antônio Pereira da Silva.
Ação InFoco: Antes de falarmos sobre o carnaval de Uberlândia, qual a origem e o que significa do carnaval?
Antônio Pereira: As origens do carnaval, como festa, se perdem nos tempos. Muitos pesquisadores as localizam nas velhas bacanais gregas e romanas. O significado da festa tem muito a ver com o significado da palavra “carnaval” – que significa “despedida da carne”. Atualmente o carnaval é uma data do calendário católico romano, inclusive a data mundial do carnaval é marcada pela Igreja e corresponde aos dias de preparação para o período de reflexão e sacrifícios da quaresma. Este é o seu significado atual, porém, antes da interferência religiosa católica, ele já era uma festa religiosa porque era em homenagem a deuses como Baco, Dionísio e outros malandrões da época. A Igreja tem uma importância boa na estruturação do carnaval, mas isso é assunto longo.
Ação InFoco: Quando e como começou o carnaval em Uberlândia?
Antônio Pereira: O Carnaval, em Uberlândia, começa em 1907 com a primeira passeata de um bloco organizado pelo capitão Henrique de Castro, formado por pessoas da elite (só homens): empresários, médicos, políticos, professores, por aí. Estavam mascarados e faziam críticas aos últimos acontecimentos sociais da cidade. Não se sabe o que cantavam e dançavam.
Os primeiros grupos carnavalescos organizados a desfilarem na avenida foram os ranchos de negros. Já havia os cordões de brancos, mas não eram disciplinados. Os primeiros ranchos, com o Tenentes Negros, 13 de Maio, Turunas Carnavalescos, vinham organizados em alas e na sua rabeira vinham moças e moços negros, do grupo, sambando mais livremente. O pessoal que fazia o footing seletivo da avenida (brancos de um lado, negros do outro), misturava-se nessa rabeira, independente de cor, fazendo uma mistura que ajudou bastante no amainar o preconceito. Desaparecidos os ranchos, logo vieram as escolas de samba, já misturadas, que permitiram a continuidade dessa prática. Dessa forma, pode-se dizer que o carnaval de rua, em Uberlândia ajudou no combate ao preconceito que já foi muito forte na cidade.
Ação InFoco: Qual foi a primeira escola de samba de Uberlândia a sair na avenida?
Antônio Pereira: A primeira escola de samba a desfilar pelas ruas de Uberlândia, foi a Tabajara, em 1954, fundada por Arlindo de Oliveira Filho, mais conhecido nos meios sambistas como General Lotinho. Desfilou sozinha sem que houvesse horário ou itinerário determinado. Zoaram pelo centro da cidade o tempo que quiseram e por onde quiseram. Eram em torno de 30 pessoas, das quais 10 na bateria.
Ação InFoco: Qual o primeiro samba enredo e qual o nome do seu puxador?
Antônio Pereira: Aqui em Uberlândia? Mesmo no Rio de Janeiro, berço e modelo de todas as escolas de samba, é difícil localizar esse pormenor. Aqui também. Nossas primeiras escolas de samba saiam cantando sambas carnavalescos gravados pelos cantores do rádio. É bem possível que essa iniciativa tenha sido da pioneira Tabajara e o seu puxador tenha sido o Lotinho, que era cantor da noite na cidade.
Ação InFoco: Na sua opinião qual foi o fato mais marcante na história do Carnaval de Uberlândia?
Antônio Pereira: Há muitos fatos marcantes e talvez o de minha eleição não seja o de outras pessoas. Mas, vá lá. O fato mais marcante da história do Carnaval de Uberlândia foi a criação da Secretaria Municipal de Cultura pelo prefeito Zaire Rezende, em 1983. Eu diria até que foi o fato mais importante da história da cultura popular na cidade. A partir de 1983, as expressões de cultura popular começaram a ser respeitadas e protegidas pelo poder público e puderam manter-se e manifestar-se sem maiores problemas. A época coincide com o início da decadência do carnaval de salão e o desenvolvimento das escolas de samba. Pode-se dizer, também, que o fato marcante da história do nosso carnaval foi a sua criação em 1907 – mas este fato deve ser considerado extra concorrência.
Ação InFoco: Como o senhor vê o carnaval hoje?
Antônio Pereira: O Carnaval de hoje está transformado. Sempre tivemos duas formas de carnaval: uma interna, restrita, seletiva (os bailes, o carnaval de salão) e outra liberal e ampla (o carnaval de rua). Houve uma inversão de ambientação. O carnaval de salão, abandonou a restrição das paredes dos clubes e da disciplina social da diretoria e avançou para os espaços vazios das praias e das praças, totalmente liberalizado. Tanto que o crescimento desse tipo de festa decretou o desaparecimento dos bailes carnavalescos, hoje, insignificantes, arremedos das grandes festas de 2/3 do século passado. O carnaval de rua encolheu-se para dentro das escolas de samba e se tornou restrito e seletivo. É claro que há exceções principalmente nas cidades onde ele é mais exuberante: Rio de Janeiro, Salvador, Recife e Olinda. Aí, continuam as festas de rua, abertas a qualquer um de qualquer origem, fantasiado ou não. Mas aqui na região, principalmente em Uberlândia, é assim.
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